Tive a ideia de abrir esse tópico pois convivo com uma séria restrição quando preciso aerografar alguma peça ou a própria pintura final. Eu moro em um apartamento, e minha bancada fica no meu próprio quarto, logo, pintar com tintas a base de solventes tóxicos estava fora de cogitação por motivos bem justos. Minha única alternativa era pintar na sacada, o que atualmente não me ajuda muito, pois dependo da luz do dia e das condições climáticas. Como eu estudo e trabalho o dia inteiro, só posso trabalhar nos kits a noite, o que já me impossibilita de pintar.
Para poder contornar essa situação, comecei a procurar artigos e blogs que tivessem informações a respeito de cabines de pintura. Encontrei vários links que mostram o passo a passo da construção de pequenas cabines de pintura. Entretanto, minha maior preocupação é que pretendo pintar no meu quarto, e não quero que nenhum resquício de gases tóxicos permaneça lá depois da pintura, afinal eu durmo lá e não quero me intoxicar dormindo. Os links que encontrei não especificam nada sobre vazões, pressões e outras características de um circuito de ventilação/exaustão, o que me deixava com um certo receio de construir algo que não suprisse minha necessidade.
Esse semestre estou cursando uma disciplina de ventilação de minas (eu curso engenharia de minas), e então resolvi colocar em prática os novos conhecimentos sobre o assunto e construir minha cabine de pintura.
Sei que na maioria dos casos, dependendo de onde se quer colocar a cabine de pintura, não se precisa de grandes projetos e cálculos, mas no meu caso resolvi projetar algo mais “completo”, embora a maior parte das peças que se compra não possuem as especificações descritas necessárias para realizar os cálculos. Então, para os que se interessarem por um pouco de teoria, aqui vão algumas informações interessantes e mais simplificadas.
A equação de Atkinson simplificada nos dá uma ideia muito boa do que se precisa para montar um sistema de ventilação que supra suas necessidades. A equação é dada por:
H=R*Q^2
Onde:
H = perda de carga (Pa)
R = resistência do sistema (N.s2/m8)
Q = vazão (m3/h)
A resistência é calculada pela equação:
R=(k*P*L)/A^3
Onde:
k = fator de atrito (N.s2.m-4)
P = perímetro da tubulação (m)
L = comprimento da tubulação (m)
A = área de seção da tubulação (m2)
Logo de cara é possível ver que uma pequena alteração no diâmetro da tubulação já causa uma diferença enorme na resistência do sistema. O fator de atrito é um número que não se obtém facilmente, pois os fabricantes de tubulações comuns não se dão ao trabalho de calcular, e provavelmente poucas pessoas fora do ramo tenham interesse em saber. Mas a seção da tubulação é algo que devemos nos preocupar, principalmente quando a tubulação tiver uma seção pequena, que é o caso de uma cabine de pintura.
Eu encontrei dois ventiladores de 120 mm de diâmetro, bivolts, na Severo Roth. Eles são a cópia um do outro, embora não sejam da mesma marca. Nenhum deles tinha informações a respeito de vazão ou pressão, mas como tinham uma velocidade de fluxo apreciável resolvi comprar. Com a ajuda de um anemômetro da universidade eu medi a velocidade, que deu algo entre 5 e 6 m/s, logo a vazão é de algo próximo dos 204 m3/h. Como comentei anteriormente, não quero que fique nenhum resquício de poluentes no meu quarto, por isso que comprei dois ventiladores.
Agora vem algo muito importante, para quem quiser usar mais de um ventilador ao mesmo tempo. Você pode fazer associações em série e em paralelo, e a diferença entre elas é enorme, e se não forem bem feitas o resultado pode ser pior do que usar um único ventilador.
Associação em série deve ser usada quando um ventilador não gera pressão suficiente para vencer a resistência do sistema. Ao colocar dois ventiladores em série você soma as pressões, mas NÃO as vazões.
Associações em paralelo devem ser usadas quando se quer aumentar a vazão. Dessa vez se somam as vazões, mas a pressão do sistema continua a mesma.
Você pode associar diferentes ventiladores, mas o ideal é usar ventiladores iguais, por diversos motivos que não vou me ater aqui, mas caso alguém queira saber, é só me perguntar.
Resolvi colocar os ventiladores em paralelo, assim a vazão de fluxo livre total seria de uns 400 m3/h.
Com uma vazão em mãos, dimensionei uma cabine com 60 x 40 x 35 cm, o que dá um volume de 0.084 m3. Considerando uma reciclagem rápida do ar (1 segundo) a vazão necessária seria de 302 m3/h, ou seja, os ventiladores associados dariam conta e ainda sobraria. Se eu pintasse exclusivamente com tintas acrílicas ou esmalte, um ventilador seria suficiente, mas como uso automotivas, prefiro “errar” para mais dessa vez, e me livrar o quanto antes do forte cheiro.
Outro aspecto importante, que provavelmente a maioria deve ter conhecimento, é a fato de que a vazão descrita pelo fabricante (quando está descrita) é uma vazão de fluxo livre, ou seja, o ventilador não está conectado a um sistema de tubulação, logo não tem uma resistência, portanto a menos que você use o ventilado na sua, cara para se refrescar no verão, a vazão nunca será aquela descrita, será sempre menor. Fabricantes maiores fornecem a curva do ventilador, que é um gráfico de Vazão X Pressão que descreve o comportamento do ventilador sobre diferentes relações. Para descobrir a vazão em que seu ventilador irá trabalhar, seria preciso plotar no mesmo gráfico a curva característica do seu sistema de ventilação (que não dá para calcular se não souber a resistência da tubulação). O ponto onde as curvas se interceptam lhe dirá a vazão de trabalho, ou a vazão real do seu sistema. A partir dessas curvas, você pode optar por fazer uma ou outra associação de ventiladores para melhor a eficiência do sistema.
Os ventiladores axiais apresentam uma zona de “stall” quando trabalham com vazões muito baixas, o que reduz muito a vida útil, portanto vale a pena checar a vazão na saída do seu sistema para ver se não está muito abaixo da vazão de fluxo livre, o que pode indicar que a pressão que o ventilador fornece não é suficiente (um ventilador mais potente ou uma associação em série podem resolver o problema).
Acho que já passei do limite de pasciência de vocês com esse monte de teoria, então vou passar para a construção da minha cabine de pintura.
Os materiais:
-Placas de MDF (eu peguei de 15mm, mas achei que ficou bem pesado no final);
-2 ventiladores 110-220 V;
-1 lâmpada PL de 7W;
-1 soquete para a lâmpada;
-Papelão de alta densidade (não se se é esse o nome pois já tinha em casa e não sei de onde veio);
-Interruptor; parafusos, porcas, arruelas, fios e etc.. para ligar e fixar tudo.
Placas de MDF já cortadas e furadas
Ventiladores
Todos os demais itens
Coifa feita com o tal papelão sem origem definida e a tubulação flexível que não funcionou como esperado
Comprei o MDF na Leroy Merlin, pois lá eles já cortam nas dimensões que vecê precisa, a única coisa que precisei fazer foram os furos de 120mm para os ventiladores. Depois de montar uma vez para ver como a estrutura ficaria, eu desmontei e comecei a pintar.
Peças pintadas e prontas para começar a montagem
Enquanto a tinta secava eu comecei a construir uma coifa com o papelão. Num primeiro momento eu construí apenas a base, pois tinha comprado uma tubulação flexível de secadora. Mas tive um sério problema quando testei. A tubulação oferecia uma resistência muito alta, pois tinha um diâmetro menor (100 mm) e é muito rugosa. Além disso, foi somado ao fato de que o formato da coifa e a junção com a tubulação possibilitaram um contra-fluxo de ar entre os ventiladores. Aí está a prova de que associações devem ser feitas com cuidado, e a tubulação deve ser bem dimensionada. Mas foi bom para aprender a pensar nos diversos detalhes.
Seguindo com a construção.
Depois de pintadas as peças, comecei a montar novamente. Fixei os ventiladores com barras rosqueadas, porcas e arruelas. Lâmpada, interruptor e suporte para o aerógrafo com parafusos. Os fios elétricos foram unidos do modo convencional (enrolando os fios e cobrindo com fita isolante), mas pretendo comprar alguns conectores para melhorar a instalação. Os fios foram fixados nas paredes com cola quente.
Ventiladores fixados no "teto", e as paredes já aparafusadas
Bom, tudo estava funcionando, e já estava pronto para começar a pintar meu Bf-109 F2, quando tive o problema do contra-fluxo de ar. Isso me tomou mais alguns dias, até eu decidir construir toda a tubulação com o papelão. Minha ideia inicial era fazer algo pequeno e bem portátil, por isso investi no tubo flexível (que não deu certo). Então optei por algo portátil, mas não tão pequeno.
Cabine pronta e operante. Podem notar que a tubulação ficou bem grande, mas funciona muito bem (ainda falta pintar....)
O resultado ficou muito bom para meu gosto. Já utilizei "automortíferas" e o cheiro vai embora muito rápido (ainda assim uso máscara com filtro químico). Agora vou poder acelerar o processo de construção dos meus modelos.
Espero que de alguma forma isso seja útil para vocês.
Abraço a todos e qualquer dúvida ou pergunta estou a disposição!
Para poder contornar essa situação, comecei a procurar artigos e blogs que tivessem informações a respeito de cabines de pintura. Encontrei vários links que mostram o passo a passo da construção de pequenas cabines de pintura. Entretanto, minha maior preocupação é que pretendo pintar no meu quarto, e não quero que nenhum resquício de gases tóxicos permaneça lá depois da pintura, afinal eu durmo lá e não quero me intoxicar dormindo. Os links que encontrei não especificam nada sobre vazões, pressões e outras características de um circuito de ventilação/exaustão, o que me deixava com um certo receio de construir algo que não suprisse minha necessidade.
Esse semestre estou cursando uma disciplina de ventilação de minas (eu curso engenharia de minas), e então resolvi colocar em prática os novos conhecimentos sobre o assunto e construir minha cabine de pintura.
Sei que na maioria dos casos, dependendo de onde se quer colocar a cabine de pintura, não se precisa de grandes projetos e cálculos, mas no meu caso resolvi projetar algo mais “completo”, embora a maior parte das peças que se compra não possuem as especificações descritas necessárias para realizar os cálculos. Então, para os que se interessarem por um pouco de teoria, aqui vão algumas informações interessantes e mais simplificadas.
A equação de Atkinson simplificada nos dá uma ideia muito boa do que se precisa para montar um sistema de ventilação que supra suas necessidades. A equação é dada por:
H=R*Q^2
Onde:
H = perda de carga (Pa)
R = resistência do sistema (N.s2/m8)
Q = vazão (m3/h)
A resistência é calculada pela equação:
R=(k*P*L)/A^3
Onde:
k = fator de atrito (N.s2.m-4)
P = perímetro da tubulação (m)
L = comprimento da tubulação (m)
A = área de seção da tubulação (m2)
Logo de cara é possível ver que uma pequena alteração no diâmetro da tubulação já causa uma diferença enorme na resistência do sistema. O fator de atrito é um número que não se obtém facilmente, pois os fabricantes de tubulações comuns não se dão ao trabalho de calcular, e provavelmente poucas pessoas fora do ramo tenham interesse em saber. Mas a seção da tubulação é algo que devemos nos preocupar, principalmente quando a tubulação tiver uma seção pequena, que é o caso de uma cabine de pintura.
Eu encontrei dois ventiladores de 120 mm de diâmetro, bivolts, na Severo Roth. Eles são a cópia um do outro, embora não sejam da mesma marca. Nenhum deles tinha informações a respeito de vazão ou pressão, mas como tinham uma velocidade de fluxo apreciável resolvi comprar. Com a ajuda de um anemômetro da universidade eu medi a velocidade, que deu algo entre 5 e 6 m/s, logo a vazão é de algo próximo dos 204 m3/h. Como comentei anteriormente, não quero que fique nenhum resquício de poluentes no meu quarto, por isso que comprei dois ventiladores.
Agora vem algo muito importante, para quem quiser usar mais de um ventilador ao mesmo tempo. Você pode fazer associações em série e em paralelo, e a diferença entre elas é enorme, e se não forem bem feitas o resultado pode ser pior do que usar um único ventilador.
Associação em série deve ser usada quando um ventilador não gera pressão suficiente para vencer a resistência do sistema. Ao colocar dois ventiladores em série você soma as pressões, mas NÃO as vazões.
Associações em paralelo devem ser usadas quando se quer aumentar a vazão. Dessa vez se somam as vazões, mas a pressão do sistema continua a mesma.
Você pode associar diferentes ventiladores, mas o ideal é usar ventiladores iguais, por diversos motivos que não vou me ater aqui, mas caso alguém queira saber, é só me perguntar.
Resolvi colocar os ventiladores em paralelo, assim a vazão de fluxo livre total seria de uns 400 m3/h.
Com uma vazão em mãos, dimensionei uma cabine com 60 x 40 x 35 cm, o que dá um volume de 0.084 m3. Considerando uma reciclagem rápida do ar (1 segundo) a vazão necessária seria de 302 m3/h, ou seja, os ventiladores associados dariam conta e ainda sobraria. Se eu pintasse exclusivamente com tintas acrílicas ou esmalte, um ventilador seria suficiente, mas como uso automotivas, prefiro “errar” para mais dessa vez, e me livrar o quanto antes do forte cheiro.
Outro aspecto importante, que provavelmente a maioria deve ter conhecimento, é a fato de que a vazão descrita pelo fabricante (quando está descrita) é uma vazão de fluxo livre, ou seja, o ventilador não está conectado a um sistema de tubulação, logo não tem uma resistência, portanto a menos que você use o ventilado na sua, cara para se refrescar no verão, a vazão nunca será aquela descrita, será sempre menor. Fabricantes maiores fornecem a curva do ventilador, que é um gráfico de Vazão X Pressão que descreve o comportamento do ventilador sobre diferentes relações. Para descobrir a vazão em que seu ventilador irá trabalhar, seria preciso plotar no mesmo gráfico a curva característica do seu sistema de ventilação (que não dá para calcular se não souber a resistência da tubulação). O ponto onde as curvas se interceptam lhe dirá a vazão de trabalho, ou a vazão real do seu sistema. A partir dessas curvas, você pode optar por fazer uma ou outra associação de ventiladores para melhor a eficiência do sistema.
Os ventiladores axiais apresentam uma zona de “stall” quando trabalham com vazões muito baixas, o que reduz muito a vida útil, portanto vale a pena checar a vazão na saída do seu sistema para ver se não está muito abaixo da vazão de fluxo livre, o que pode indicar que a pressão que o ventilador fornece não é suficiente (um ventilador mais potente ou uma associação em série podem resolver o problema).
Acho que já passei do limite de pasciência de vocês com esse monte de teoria, então vou passar para a construção da minha cabine de pintura.
Os materiais:
-Placas de MDF (eu peguei de 15mm, mas achei que ficou bem pesado no final);
-2 ventiladores 110-220 V;
-1 lâmpada PL de 7W;
-1 soquete para a lâmpada;
-Papelão de alta densidade (não se se é esse o nome pois já tinha em casa e não sei de onde veio);
-Interruptor; parafusos, porcas, arruelas, fios e etc.. para ligar e fixar tudo.
Placas de MDF já cortadas e furadas
Ventiladores
Todos os demais itens
Coifa feita com o tal papelão sem origem definida e a tubulação flexível que não funcionou como esperado
Comprei o MDF na Leroy Merlin, pois lá eles já cortam nas dimensões que vecê precisa, a única coisa que precisei fazer foram os furos de 120mm para os ventiladores. Depois de montar uma vez para ver como a estrutura ficaria, eu desmontei e comecei a pintar.
Peças pintadas e prontas para começar a montagem
Enquanto a tinta secava eu comecei a construir uma coifa com o papelão. Num primeiro momento eu construí apenas a base, pois tinha comprado uma tubulação flexível de secadora. Mas tive um sério problema quando testei. A tubulação oferecia uma resistência muito alta, pois tinha um diâmetro menor (100 mm) e é muito rugosa. Além disso, foi somado ao fato de que o formato da coifa e a junção com a tubulação possibilitaram um contra-fluxo de ar entre os ventiladores. Aí está a prova de que associações devem ser feitas com cuidado, e a tubulação deve ser bem dimensionada. Mas foi bom para aprender a pensar nos diversos detalhes.
Seguindo com a construção.
Depois de pintadas as peças, comecei a montar novamente. Fixei os ventiladores com barras rosqueadas, porcas e arruelas. Lâmpada, interruptor e suporte para o aerógrafo com parafusos. Os fios elétricos foram unidos do modo convencional (enrolando os fios e cobrindo com fita isolante), mas pretendo comprar alguns conectores para melhorar a instalação. Os fios foram fixados nas paredes com cola quente.
Ventiladores fixados no "teto", e as paredes já aparafusadas
Bom, tudo estava funcionando, e já estava pronto para começar a pintar meu Bf-109 F2, quando tive o problema do contra-fluxo de ar. Isso me tomou mais alguns dias, até eu decidir construir toda a tubulação com o papelão. Minha ideia inicial era fazer algo pequeno e bem portátil, por isso investi no tubo flexível (que não deu certo). Então optei por algo portátil, mas não tão pequeno.
Cabine pronta e operante. Podem notar que a tubulação ficou bem grande, mas funciona muito bem (ainda falta pintar....)
O resultado ficou muito bom para meu gosto. Já utilizei "automortíferas" e o cheiro vai embora muito rápido (ainda assim uso máscara com filtro químico). Agora vou poder acelerar o processo de construção dos meus modelos.
Espero que de alguma forma isso seja útil para vocês.
Abraço a todos e qualquer dúvida ou pergunta estou a disposição!